...Onde estão os velhos tempos? O que aconteceu com eles? Quero sentir a sensação de liberdade. Mas até agora só sinto o tédio apossando-se da minha existência. Quero sair e beber de novo. Quero pegar um carro e pisar fundo ao acelerador até o motor fundir. Eu quero sentir o vento soprar no meu rosto com toda a intensidade, soprará tão forte que não conseguirei manter meus olhos abertos. Estarei por um momento sublime cego. Mas não cego aos sinais, as inteligências. Estarei cego aos planos, as regras. Serei realmente livre. Abrirei a geladeira e darei o gole na cerveja gelada. O gole de um milhão de dólares.
O gole de um milhão de dólares
...Evandro chegou do trabalho mais cedo do que costumava chegar. Mas aquele dia era especial. Trabalhava em uma livraria. Chegou aparentemente cansado, mas com uma vibração interior incrível. Estava em casa para ver o jogo da seleção. Sentou-se no sofá em frente à TV, mirou o controle a ela que imediatamente após um segundo começou a transmissão. Mostrou mulheres maravilhosas se agarrando a uma grande garrafa de cerveja. Comercial. Logo um grande abridor saia do meio das nuvens e: “Tsssh...” O líquido dourado, com aparência fresca preenchia um copo. Depois uma mão apanhava o copo e... Evandro não se agüentou. Correu até a geladeira e pegou algumas latinhas, colocou-as em um isopor pequeno que mantinha ali perto adicionando também gelo. Quase voltando à sala deu meia volta e alcançou um pacote de amendoim. Levou para sua guarda, em uma mesinha de centro que manteve ao lado do acento.
...O jogo começou. Buscou uma cerveja que quando aberta reproduziu apenas metade do que a televisão mostrara. Um “Tsh” chocho, brochante. Mas Evandro não ligou para isso. Imediatamente enquanto trazia a latinha para perto da boca começou a confabular no fim de sua vontade. Podia até sentir a cerveja preenchendo sua boca. Estupidamente gelada. Depois descendo pela garganta. Um merecido “Ah...” Ele até sacrificou uma cobrança de lateral para o tão esperado gole. Como se tivesse ensaiado muitas e muitas vezes. Olhos cerrados latinha a boca. Apenas uma ilusão. Depois de engolir sentiu-se meio frustrado, pois a sensação de refrescância tão esperada não era maravilhosa, pelo menos não como tanto imaginara. O conteúdo preenchia sua boca, mas amortecia-lhe a língua. Estupidamente gelada. Dava-lhe mais vontade de beber, não mais apreciava a bebida, mas mandava ela para dentro com finalidade de deixar a sensação salgada do amendoim.
...No intervalo entre o primeiro e o segundo tempo, nenhuma alteração. Nem se quer cruzou as pernas, alongou-se, deu uma volta em torno da cadeira, pegou mais cerveja, mais amendoim, nada. Ficou ali apreciando a programação e alguns comentários. Quando o jogo terminou, o placar deprimente: 2x0.